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terça-feira, 31 de julho de 2012
Brincando de lembrar
Houve uma vez uma arma das mais letais no sertão: nós a chamávamos de "baliera", porque disparava balas em forma de pedras catadas no chão em velocidade de relâmpago. Em outras terras, como aquelas de onde vinham as revistas em quadrinhos, o nome era mais pomposo: estilingue. Mas só nós dominávamos as manhas nem um pouco verbais desse instrumento infantil de defesa primordial. As balieiras do sertão não quebravam vidraças, pelo simples fato de que não havia esses luxos no nosso grotão. No máximo, quebravam telhas mal colocadas sobre nossas toscas mais acolhedoras casas. Ou reverberavam entre janelas de madeira crua, poucos postes de iluminação pública e a cabeça furada de um ou outro menos felizardo.
No reino das meninas, inocentes caixas de fósforos esvaziadas pelo cozinhar dos almoços atiçavam fogo nas imaginações. E as caixinhas viravam móveis em miniatura. Nos casos de pobreza mais humilde e criatividade infantil mais extrema uns reles sabugo de milho ressecado podia se transformar para todo e qualquer efeito em uma boneca desconcertante, pronta pra se embalar num colo de menina aquecido pela carência material de tudo. Bastava recobrir o sabugo com um trapinho de pano e dava-se o milagre, conforme contam as memórias de gente como dona Maria Izabel, minha sogra.
Mas, brinquedo entre os brinquedos, o meu preferido era uma rodinha de rolimã conseguida não sei bem onde - certamente nas oficinas da vizinhança - e equipada com um bastão de ferro de ponta curva que se usava para guiar o veículo rua acima e rua abaixo. Visitantando com os moderninhos Bernardo e Cecília a exposição permanente de brinquedos antigos - artesanais, pobres e fantásticos, pra não dizer simplesmente divertidos como nenhum boneco de Ben 10 dos dias atuais - na sede do IFRN no centro de Natal, dei de cara com minha antiga diversão. Um instante de alumbramento no tumulto da avenida Rio Branco, daqueles que aspiram o som do trânsito lá fora e instalam a sala da memória pura por dentro.
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