De Brasília a Pirangi, de Taguatinga a Natal, nosso amigo Gustavo de Castro segue lapidando sua razão poética sempre afiada. O texto abaixo é sua "Retrospectiva poética" do ano (e o link para o blogue do moço, você sabe, está na lista dos "Outros Cardápios" do Sopão). Dá-lhe, Gustavo:
"De Janeiro a Dezembro, o ano foi dividido em doze casas de trinta noites instáveis.
Nas noites sem toques ocorreram flutuações cruas. Dormiu-se trezentas vezes de barriga vazia e sonhou-se com o leite do desejo derramado.
Durante o ano, nem o silêncio nem o bom senso venceram o palavreado e o falatório. Tiveram tardes todos os dias, mas alguns dias não tiveram manhãs. De todas saiu-se com o desejo de ficar.
Afundou-se na terra para além de pedra de sal. Cascaviou-se a terceira dimensão e nenhum livro salvou da fome este ano.
Cortaram dois trilhões de árvores distintas; respirou-se mal e ninguém comeu sem colesterol. A masturbação feminina superou todas as mãos juntas. Inclusive a das flores.
Esteve-se mais sentado do que andando. Mediante o tempo parado fez-se muita coisa no espaço oscilante. Os rastros dos sorrisos contados deram dois trilhões de alegrias dispersas. Mesmo assim, chorou-se muito.
Nem todas as lágrimas valeram a pena.
Em sete minutos terminou-se quatro anos. Cinqüenta quintas feiras quiseram charutos e brincos de ouro. Dois dentes amoleceram e outros dois foram caiados.
Vinte-e-uma topadas não derrubaram o cabra.
Dez sambas foram compostos. Cinco roques refeitos blues. Nada mudou na esquina exceto os mendigos. A paz mundial não foi alcançada e não foi desta vez que o mundo se acabou.
Não havendo linha divisória entre nada e nada, nadou-se entre instantes não como merda n’água. Algumas aulas valeram a pena, outras vezes foram as cachaças que valeram.
Choveram dois trilhões de harmonias dispersas. Um terço era verde e rosa.
Neste ano todas as lágrimas encontraram lugar para cair. Mas nem todas valeram a pena"
conexões entre amigos, livros, filmes, discos, memórias, férias, viagens, natal e brasília
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