O gênero é espetacular e norte-americano por excelência. Só por isso você já pode estranhar quando depara com um "filme de guerra" feito por brasileiros. A Estrada 47 é este filme, em cartaz. Mas tenho uma boa notícia caso você torça o nariz para a petulância brazuca de invadir tema tão segmentado, temendo entrar no cinema e ser sufocado por um filme de grandiloquência ridícula, do tipo que não tem vergonha de macaquear o cinemão gringo. Pois é, essa Estrada 47 não é nada disso - antes pelo contrário.
O que resulta dessa ousadia de afrontar gênero tão consagrado é um contículo de guerra, um drama contido e quase curvado de tão consciente de seu próprio atrevimento. Um pequeno e em muitos momentos quase covarde pelotão de pracinhas brasileiros consegue uma ligeira proeza ao reabrir uma estrada pavimentada por minas e meio que "libertar", para manter o clima de filme de guerra, uma pequena cidade italiana.
Tudo isso é feito em compasso de novela literária, em andamento de crônica, ritmo capaz de se ocupar menos com heroísmos ianques e mais com minúcias humanísticas - veja-se por exemplo a curiosa e sensível história do pracinha nordestino, quase um conto menor dentre desse contículo em forma de filme.
Em tudo, o filme diz que, na guerra ou no cinema de gênero, somos tal e qual o soldado Piauí: pequenos, titubeantes, medrosos no geral porém valentes quando uma circunstância especial e específica nos desperta a coragem. Desde os anos 40, esse cinema somos nós, com os intervalos entre parênteses do tipo Cinema Novo que nos fizeram célebres por períodos determinados.
E como que para comprovar isso A Estrada 47 termina com uma metáfora visual perfeita e acachapante: a entrada triunfal do tanque norte-americano chegando com festa na cidade libertada (mas não por eles) e esmagando impiedosa a câmera fotográfica que registrou o pequeno feito dos soldados brasileiros. Se há patriotada aí, é de um tipo sutil, silencioso e acanhado - como nós todos quando temos a coragem de nos ver como realmente somos.
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