quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Redações


A atual tem, não por acaso, o apelido de "o shopping". Quem a conhece do vídeo ou pessoalmente matará rápido a não-charada: o jogo de luzes de uma redação cenográfica, que serve ao mesmo tempo como espaço de trabalho proprimente dito e como cenário para programas de tevê e telejornais, dá ao ambiente um ar neonzado de mall metropolitano. Mas nada se vende aqui, além de informações que lutam para não serem embaladas qual mercadoria.

A "mais redação" de todas as redações por onde passei continua sendo a do Correio Braziliense, com sua profusão de pequenas ruas de escrivaninhas, suas pilhas de livros dispersos sobre mesas, sua faina de papel quase falante para onde quer que se olhasse. Foi reformada, ganhou luzes, neonzou-se como manda a nova estética do mundinho jornalístico mas, desconfio, ainda guarda aquele ar de antro modernoso de idéias em embate entre terminais de computador, programadores visuais em ação, aquários e conclusões precipitadas que marca a tal grande imprensa.

A melhor redação continua sendo a da velha Tribuna do Norte, antes de todas as reformas, quando tínhamos máquinas de escrever barulhentas, o mau humor especialíssimo de Moacir, Emmanoel Barreto a repuxar os bigodes, Célia Freire à guisa de recepção com seu cabelão e seu sorriso permanente bem na entrada do espaço. Redação de juventude. Paraíso perdido. Idealização ao contrário, poesia em forma de trabalho. Nunca vou esquecer.

Redação feinha, mas eficiente e prática, era a do velho barracão da antiga TV Cabugi, onde se conspiravam reportagens que mexessem mimimanente com a caretice orgulhosa e burra da linguagem da televisão, formatavam-se programas que vicejavam longe dos olhares bisbiolhoteiros da cabeça de rede carioca, curtiam-se plantões pioneiros de domingos numa Natal ainda sem jornais às segundas-feiras. Muitas amizades prósperas, alguns casamentos interessantes. Dessa redação não deve restar quase nada - e não é necessariamente porque o tal barração foi demolido para dar lugar a uma nova sede reluzente como tem de ser.

A antiga redaçãozinha, muito improvisada, de uma fase curta da revista RN Econômico. Foi a primeira onde dispus de computadores para escrever textos caudalosos - aliás, foi também a primeira onde tal caudalosidade nunca me deu problema, ao contrário. Jornalismo de satisfação recorde e duração restrita. O que é bom dura pouco na medição física, mas ganha uma extensão infinita na régua sentimental da memória.

A redação do Diário de Natal da virada da década de 80 para os anos 90: a mais próxima que encontrei de uma repartição pública. Nem a redação da TV Câmara, onde me encontro agora, tem aquele ar burocrático (e se tivesse certamente não faria justiça ao apelido já citado). O Diário daquele tempo - dos outros não posso falar, evidentemente - soava assim como uma mistura de gabinete de diretor de escola secundária com ante-sala de secretário estadual de Justiça. Muito séria, concentrada, contida. Boa para trabalhar, pelo silêncio e pela austeridade - mas fraca em criatividade diante da então adversária redação da Tribuna logo abaixo ali na Ribeira.

E enquanto o jornalismo vive sua revolução de formas, meios e instrumentos, fico aqui pensando em que medida suas redações influenciam na formação de seus profissionais. Ou se de fato essa reflexão fará sentido daqui a - quanto tempo mais? - quando a virtualização mais total fará de cada escritório caseiro uma redação atomizada, realizando nosso sonho de conforto profissional que parecia tão impossível mas ao mesmo tempo nos isolando ainda mais. Aí já não fará sentido nem o questionamento e nem a saudade de tantas redações passadas, sobretudo daquelas que não voltam mais.

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