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domingo, 15 de novembro de 2015
O velho, o livro e a política
O velho Getúlio, sempre ele. Livro vai, livro vem, o Leitor Bagunçado se vê às voltas com a figura gorducha, complexa, contraditória e - talvez por tudo isso junto - mais característica não só da política como da História do Brasil. Na juventude primeira, era o Getúlio odiado e odioso que massacrou com frieza a esquerda dos anos 30 - aquela que, sabe-se lá como, achava que o país estava prontinho pra uma revolução comunista. Do painel geral de auto-enganos sobressai mesmo é a violência pessoal e específica, portanto de caráter desesperadamente humano, contra Olga Benário. E quem não chorou lendo as últimas páginas do livro do insuspeito Fernando Moraes que atire o primeiro boneco inflável de Lula.
A bibliografia dos 20 anos - Memórias do Cárcere; O Cavaleiro da Esperança e similares - reforçava essa visão de seu Getúlio. Mas o tempo passa e a figura Getulina vai adquirindo, junto com as vivências e leituras, contornos mais complexos. Percebe-se a figura de um estadista mínimo (o que no Brasil é sempre algo a destacar) diante um paredão de atrasos de cores variadas que faz com que a gente veja o quanto aquela esquerda liderada por Prestes lia errado o desenho dos seus reais adversários. Se ele próprio, Prestes, reviu isso, quem somos nós pra não relativizar. Espetamos então aquele alfinete revisionista no boneco inflado do ex-ditador. Pois agora, depois de tudo, vem Lira Neto com sua série biográfica em cima do muro no melhor sentido da expressão pra balançar de novo o edifício do getulismo.
No primeiro volume ficou intacta minha admiração pelo gaúcho quem marcou o Brasil, arrancando com a revolução de 30 as bases solapadas de um fazendão que talvez nem merecesse o nome de país. Mas agora, nas barbas do Estado Novo para onde nos leva o volume dois, tá difícil: não é volubilidade de opinião, é que Lira é bem danado em mostrar como, aos pouquinhos, uma certa de mistura de política pequena com bajulação gigantesca e falta de parâmetros legais que garantam o que quer que seja é capaz de, ato após ato, pequena violência aqui com mais outra ali, construir um perfeito sistema opressor. Eu pelo menos me acostumei a ver o Estado Novo como algo muito bem engrendrado, esquematizado, arquitetado de maneira a cobrir toda a atividade política do país - como algo feito assim numa megaconspiração de reunião madrugada a dentro a portas fechadas. E, para além do ato espúrio de um homem só escrever uma "constituição", não foi bem assim. Foi aos poucos, como na vida.
Quando se viu, a empanada do monstro cobria a tudo e a todos, sufocando, futuramente, o próprio Getúlio que, no acumulado de feitos, desfeitos e não feitos, encurralou-se por meio dos inimigos que a política sempre planta. A política, esse quebra-cabeças de peças que ora de organizam de um jeito, ora de outro (as nuvens de Tancredo,lembram?). São variáveis demais e quando se puxa a corda excessivamente pra um lado pode aguardar que o empuxo contrário virá na certa. Biografias feitas no capricho são ótimas para mostrar esse fenômeno recorrente e, infelizmente no nosso caso, tão repetitivos.
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