terça-feira, 8 de maio de 2012

Vidas Secas










Acabei de assistir pela primeira vez, entre impressionado e comovido, ao clássico do cinema brasileiro “Vidas Secas” no link do YouTube. Um filme de fotografia muito mais que poética de tão expressiva (feita, salvo engano, por Luiz Carlos Barreto), econômico como a prosa do livro que o gerou, gráfico e ao mesmo tempo sensível à realidade que projeta, a da nossa ascendência comum de nordestinos fadados a enfrentar essa sentença climática passada, a da seca, que aqui e ali volta a assaltar o presente, como acontece agora mesmo neste 2012.

Um filme quase mítico de tão realista, encorpado pela luz estourada do sertão e pela música rangente das rodas do carro de boi. Com um Nordeste que, por mais açoitado pela miséria e pela desigualdade, nunca perde a altivez interna do subjugado. Com um Fabiano cheio de dignidade ainda que debaixo da chibata ancestral da polícia e uma Sinhá Vitória plena de soberana humanidade na sua  luta para se distinguir dos bichos. Um filme onde até os bichos impõem respeito, da cachorra Baleia aos preás que ela está sempre a caçar.

Um filme que me lembrou a figura do meu pai, que se bastava na sua presença de sertanejo sem precisar fazer qualquer discurso diante de quem lhe foi posto na vida em posição superior. Que me lembrou também meus tios, no desengonçar de suas passagens por esta vida como suficientes pastores cada um de seus rebanhos familiares. Um filme que me lembrou a sombra protetora do meu avô materno e a presença sempre tão remota e temerosa do meu vicentino avô paterno. Como se todos tivessem se sentado à mesma mesa de madeira crua comigo para essa janta cinematográfica de filme de formação.

Meu pai, meus avós, meus tios, Vidas Plenas de generosidade e consciência do que são e representam, Vidas Cheias de senso nordestino de resistência, coragem e disposição sob o mais rigoroso sol do tempo.


*E imaginar como terá sido uma plateia de burgueses franceses assistindo a tudo isso no Palácio dos Festivais em Cannes, 1964, é algo que dá muito o que pensar.

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