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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010
Andar com Caetano
Na postagem anterior, falava-se sobre a pena imposta ao pobre do Chico Buarque de Holanda, que anda quilômetros e quilômetros cabisbaixo e cabreiro para as gravações da série de DVDs que reconta sua história no panorama musical brasileiro. Dizia lá que os produtores da série só deram um folguinha para as andanças de Chico, nos momento em que ele, no lugar de andar, está falando feito um oráculo compulsivo. Ainda bem que é bom de papo e que o material de arquivo usado é vasto e não mata o velho de tanto falar e caminhar.
Pois qual não foi minha surpresa ao ver que fizeram muito pior com Caetano Veloso. Nâo sei se foi inveja - afinal, não dá pra esquecer os desentendimentos históricos, verdadeiros ou falsos, entre os dois papas da emepebê - mas o fato é que em "Coração Vagabundo", aquele filme que fizeram recentemente com Caetano e que acaba de sair também em DVD, algo muito similar ao que acontece na série de Chico chama a atenção. Se o autor de "Vai Passar" está ou andando quilômetros ou falando pelos cotovelos, o criador de "Alegria Alegria" faz as duas coisas ao mesmo tempo neste "Coração Vagabundo". Sim, senhor, Chico ao menos fazia uma coisa de cada vez; já Caetano é obrigado a fazer as duas coisas ao mesmo tempo: dá entrevista andando, o tempo todo, às vezes atravessando ruas movimentadas, lutando para se equilibrar entre a calçada e aquela declaração bombástica que sempre se espera dele. E o baiano só falta mesmo perder o fôlego, afinal já passou dos cinquenta faz um tempinho.
A lógico do comentário aqui é a mesma do anterior: essa abordagem meio fútil dos dois produtos, tanto a série de Chico quanto o filme de Caetano lançado em DVD, quer dizer apenas que é saudável desmistificar essas figuras que, assim tratadas, não tema, ficam ainda mais interessantes. Só que no caso de Caetano, a direção do filme/DVD investiu claramente numa tentativa de fazer o que chamam de "cinema direto" - que é aquela técnica de documentário que procura grudar uma câmera no seu personagem o tempo todo, sem qualquer outro tipo de interferência, como a buscar o registro mais distanciado possível (porque próximo como uma testemunha muda) da figura retratada.
Agora, meu amigo, você pense no que é fazer "cinema direto" tendo como personagem uma figura como Caetano Veloso. Se fosse Chico, toda aquela propalada timidez facilitaria as coisas. Mas, Caetano... Pense numa missão difícil: porque, por temperamento, o baiano não consegue se conter e acaba encenando qualquer coisa para aquela câmera silenciosa. E o que poderia ser "o mais revelador retrato de Caetano Veloso", como promete um especialista na capa do DVD, não passa de mais um produto da linha Caetano Veloso (um bom produto, como sempre, mas nada que se inscreva na história da cinematografia ou da música brasileira).
Até porque, cinema direto ou não, o que acaba chamando mais a atenção é a respiração ofegante do pobre do Caetano enquanto vira esquinas entre Tóquio e não sei onde. Sim, porque este tipo de abordagem já está virando moda. Parece até início de novela da Globo, com as locações mais atraentes e deslocadas quanto seja possível. É isso: a idéia inicial da série de Chico - de situar os depoimentos em locais significativos para o tema de cada um dos DVDs - foi copiada ao pé da letra e sem o menor pudor, muito menos aquela justificativa mais evidente que se nota no caso do autor de "A Rita". E no final das contas, o uso frouxo do tal "cinema direto" fica patente naquela sequência filmada num templo budista, que resultou em algo tão zen que dá tédio. Pensando bem, o "Coração Vagabundo" de Caetano, essa canção que, como bem mostra o DVD, fala a pessoas de várias partes do mundo, poderia ter tido um tratamento melhor.
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