quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Nas brumas de Pirenópolis



Próxima e repetitiva, a viagem de feriado a Pirenópolis, este miniburgo de extração mineira e colonial resistente nas cercanias de Brasília, oferece sempre e a cada vez que se volta lá uma abordagem diversa – um calor novo, pra falar de acordo com as temperaturas da cidade. Não se engane: que Pirenópolis, como cidade pequena de crônicas cenas recorrentes do mundo rural brasileiro, tem guardada para cada visita uma paisagem de esquina, um causo de meio de rua, uma porta para aquele quintal interno que você há de ter guardado lá onde pernoitam as imagens da infância. É disso que trata essa sopalina incursão a Piri, pra combinar com o roteiro profissionalíssimo já disponível na tarimbada “Fragata Suprise” de Cyntia Campos (veja clicando aqui).


Nas brumas matinais do domingo que se inicia, Pirenópolis pode lhe derrubar da cama para uma excursão pelas ladeiras e lhe presentear com artigos como o “pão da Beth”, destaque da feira que se estica em barracas, lonas e caminhonetes ao longo da rua Prefeito Sizenando Veiga – aquela da Casa Melo, “o” supermercado de interior que também vale uma inspeção divertida. Entre trôpegos ecologistas embriagados que viraram a noite na balada da rua do lazer e encerram a jornada com pilhérias entre compradores e vendedores, a tenda da Beth é menos que isso: uma mesa improvisada onde se pode escolher entre pães artesanais de sabores não menos industriais. Saí de lá com dois, idênticos na aparência mas diversos na textura e no gosto – um integral padrão e outro de beterraba. Um deles foi de recordação da viagem para Cyntia e o segundo veio aqui para casa, onde já foi devidamente degustado, ingerido e digerido.

De pacote de pão nas mãos, descendo a ladeira principal no rumo da igreja para sepiar com minha sansung fotográfica a cara da cidade a acordar, vi-me ladeando um momento ímpar da vida numa cidade do interior, como muito bem sabe quem dela fez parte um dia. Era o momento da saída da missa matinal do domingo, missa das seis ou das sete – era o primeiro dia do horário de verão a confundir os tempos, as sensações e os relógios. A saída dos fiéis da missa, como bem sabe quem dele já fez parte, é aquele momento meio preguiçoso e meio exaustivo ao mesmo tempo. Porque o ritual da missa, bonito em si mas repetitivo quando se toma a freqüência como hábito, chega ao seu final com esse misto de espiritualidade renovada com um até-que-enfim mal represado.

Preenchido por essa mistura de sensações, ninguém deixa a missa da manhã de domingo aos tropeções: é uma saída mansa, algo etérea, quase em câmera lenta, como se as almas redesenhadas pela purgação ritualística dos pecados voltasse à vida normal com cuidado e calma, ciosa de não cometer novas infrações pelo menos nas primeiras horas da semana que se reinicia. Todo mundo sai um pouco santificado da missa matinal do domingo, quase da mesma maneira indecisa e trôpega como o bebum oficial da cidade deixa o último bar ao alvorecer do dia – e era isso que aquela visão mostrava. Um instante do tipo que não vai figurar jamais nos roteiros consagrados dos guias turísticos, da qualidade daquelas atrações que não tem preço, da modalidade de fruição que depende muito mais da disponibilidade do viajante do que da ansiedade do turista.

Com os pães nas mãos e a imagem do encerramento da missa na cabeça, resta ao curta-metragista involuntário da incipiente manhã de domingo retornar ao Pouso do Ralf, a estalagem rural plantada no centro urbano de Pirenópolis. Isolada da cidade por um muro verde de florações e antiguidades, com direito a roda de engenho e oratório no pátio, a pousada é a terceira e última parte deste falso roteiro sem trilhas e demais emoções desportivas que a cidade tomada por motos enlameadas no final de semana em que lá estivemos também tem.

O Pouso do Ralf, descobrimos enquanto ele nos hospeda, é um misto de pousada e local de culto, para o  moço que lhe dá nome. Morto há 12 anos aos 23 de idade, Ralf era esse personagem acabado das famílias bem-sucedidas no mundo rural do interior de botas e fivelas, capitão de cavalhada, filho único de heranças e destino de ouro traçado no berço. A narração pós-morte que a pousada faz daquele que lhe dá nome, ao exibir entre fotografias e outros apetrechos a roupa branca e brilhante que ele usava nas festas do Divino, é bastante para lhe envolver na história do mito – e nisso, claro, sempre se corre o risco de algum exagero.

Mas não seria exagero deparar com o, digamos, fantasma do Ralf autêntico na noite calma e silenciosa da pousada, tal o grau de culto de que ele é visivelmente objeto no local. O que não deixa de pentear o passeio todo com uma certa dose de mistério ainda mais interessante se você está, mais uma vez, em Pirenópolis, a cidade que sendo a atração mais próxima de Brasília é também, e felizmente, a mais fértil em se mostrar sempre interessante em cada novo causo cada vez que você está aqui.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Almoço na Pedreira













Da comilança do último sábado, no restaurante Pedreira, cercanias de Pirenópolis (GO), com Rejane, os meninos, Ivone e Cínthia.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Sessão Hamaca de cinema



Hoje exibindo a deontologia da Força, no episódio IV de Star Wars, hit redescoberto aqui em casa pelos neo-fãs Bernardo e Cecília, recém-apresentados à fauna de Darth Vader, Obi-Oan Kenobi, Princesa Leia e sua turma. Até agora, já foram três exibições noturnas em DVD alugado. Grande é a expectativa pela estreia de "O Império Contra-Ataca". Para seguir com as outras partes, é só pegar a trilha do YouTube que nem Joãozinho e Maria seguindo as migalhas do pão.

COWBOYS, ALIENS E SUPER 8


A temporada cinematográfica trouxe recentemente nas suas ondas de mar revolto duas rememorações do cinema dos anos 80. Passou “Super 8”, em que o diretor da série “Lost” tentou incorporar o Spielberg primário e construir quase uma releitura de “E.T” misturando um grupo de garotos dos subúrbios californianos com um desastre espetacular de trem que libera uma presença extraterrestre perturbadora como foram as de outrora. Na outra frente, veio “Cowboys e Aliens”, produzido pelo próprio Spiel, mesclando os clichês dos dois gêneros, num feliz e divertido embate entre raios devastadores e cavalgadas poeirentas.

Os dois, se você não viu e está aguardando o lançamento em DVD ou Blue Ray, não se anime, ficam nisso mesmo: a brincadeira com os padrões dos gêneros – o filme de ET, o filme de cowboy, o filme de menino assustado, um pouco de western spaghetti, um tanto de cinema catástrofe. Não há maiores transcendências, mas as piadas – muitas meramente visuais, o que as torna ainda melhores – garantem a diversão e abastecem o baú da nostalgia. Uma dessas piadas – só pode ser piada, só dá pra classificar assim – é aquele gancho de engenhoca gigante com que as naves agressoras de “Cowboys e Aliens” pescam, literalmente pescam, suas vítimas para a abdução. Aquilo deve ser o raio laser adaptado aos tempos do velho oeste. E este filme ainda tem Paul Dano, o jovem ator em combustão de “Sangue Negro” - veja no clip abaixo - e ainda o mudinho ultra-expressivo de “Pequena Miss Sunshine”, como um bad boy adolescente mimadão, quase uma ponta que esse ator consegue fazer destacar num panorama tão ligeiro como é esse dessa quase paródia.



É verdade que há momentos em que a paródia evolui para uma citação um grau acima do filme original que ele relembra: a referência aqui é ao desempenho do menino obrigado a apunhalar as entranhas melecosas de uma das criaturas extraterrenas – um momento puramente Steven Spielberg. Em tudo aquele menino lembra o infante Christian Bale nas cenas de “O Império do Sol”, vivendo aquele garoto perdido na rebelião da guerra, de repente desprovido do conforto da vida britânica que levava em Hong Kong. No limite do cinema-pavor-com-entretenimento, evoca a garotada perseguida pelos dinos no “Jurassic Park”.

Quem vence, “Cowboys e Aliens” ou “Super 8”? Como este não é aquele assunto do qual dependem os rumos da humanidade, vamos convencionar tucanamente que quem vence é a diversão sem compromisso do espectador. E também lembrar que os dois filmes são um excelente pretexto para reunir pais e filhos em idade certa na apreciação de um tipo de diversão que, embora tenha deixado suas marcas, já não habita mais a tela do cinema como antes. É como o relançamento em Blue Ray da série completa “Guerra nas Estrelas”: alugando ainda em DVD o primeiro episódio lançado, “Uma Nova Esperança”, mostrei pra meus filhos de 6 e 4 anos que foram imediatamente fisgados. Agora, pra eles, é como se Darth Vader tivesse nascido junto ontem. E foi só o Episódio IV. Pena que eles ainda não tem idade para ver “Cowboys e Aliens” nem “Super 8” – mas, quando tiverem, vai ser uma nova descoberta por sobre essas redescobertas que a tecnologia do entretenimento vem nos proporcionando.


*Esta postagem é um pequeno campo minado de links para os itens citados. Clique neles e vá se multimidiando após a leitura integral.

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